Avaliação da qualidade da malha

No post passado, vimos que o fluxo das propriedades conservadas pode ser afetado diretamente pela disposição e forma dos volumes da malha. Isto afeta a acurácia da solução, a taxa de convergência numérica e o tempo computacional necessário. Desta forma, a geração de uma malha de alta qualidade se torna de suma importância na solução de um problema CFD. Mas surge uma dúvida: o que caracteriza a qualidade de uma malha?

Parâmetros de qualidade

Em março de 2011, o site Desktop Engineering publicou a pérola (que tem seu fundamento):

"Uma regra prática em geração de malhas seria que o formato dos elementos seja agradável aos olhos."

De fato, não existe um único parâmetro ou regra que defina a qualidade de uma malha. Vale avaliar diferentes aspectos relacionado à malha, algumas regras de construção (best practices) e muita experiência acumulada.
São diferentes parâmetros que avaliam certas características dos volumes de controle na malha. A grande maioria está associada ao formato geometrico do volume e a conectividade com seus vizinhos. Outros com a densidade (quantidade) de volumes e a transição entre estes em dada região do domínio de solução. Estes parâmetros usalmente são chamados de métrica da malha.
Neste post, gostaria de apresentar e comentar sobre algumas destas métricas:

  • Aspect ratio ou razão de aspecto;
  • Skewness ou assimetria (distorção);
  • Smothness ou suavização;
  • Orthogonality ou ortogonalidade.


Razão de aspecto

A razão de aspecto é a razão entre a maior e a menor aresta do elemento. Idealmente, o valor da razão de aspecto deveria ser 1 para garantir os melhores resultados. Valores muito altos de razão de aspecto podem levar a erros inaceitáveis na aproximação numérica dos fluxos nas faces. Este fator aumenta em soluções tridimensionais.

Razão de aspecto by Shyam2791

Por exemplo, vamos avaliar a razão de aspecto na malha abaixo utilizando o software Pointwise.

Pode-se perceber que os maiores valores de razão de aspecto estão na parte inferior da malha, onde existe maior diferença no tamanho das arestas. Conforme a camada de volumes evolui, a altura dos volumes aumenta e com isso a razão de aspecto diminui. Como recomendação geral, altos valores de razão de aspecto não são desejados, mas o valor ideal (ou máximo aplicável) vai depender do solver numérico utilizado.

Mesmo assim, existem casos onde uma razão de aspecto alta pode ser usada sem medo de ser feliz. Por exemplo, para malhas quad/hexaédricas os volumes podem ser esticados onde o escoamento seja completamente desenvolvido e essencialmente unidimensional.

Skewness

O skewness representa o desvio do vetor que conecta o centro dos volumes vizinhos e o centro da face. Apresentado na figura abaixo, a distância δ representa a distorção ou skewness entre dois volumes.

Esta métrica está diretamente relacionada ao desvio do vetor que liga os centros dos volumes e o vetor normal à face e, portanto, afeta diretamente a acurácia da aproximação numérica dos fluxos. Com isso, altos valores de skewness podem facilmente degradar a solução numérica.

Existem três métodos para calcular a distorção dos volumes em uma malha:

  • Baseado no volume equilátero: pode ser aplicado apenas a triângulos e tetraedros, sendo a metodologia padrão para este tipo de volume;

Cálculo de skewness baseado no volume equilátero:

  • Baseado na normalização de um ângulo equilátero: pode ser aplicado independente da topologia da face e volume, sendo aplicado a qualquer tipo de volume. Para prismas e pirâmides, este é o método padrão;

Cálculo de skewness baseado na normalização do ângulo:

  • Baseado no desvio equiangular: semelhante ao item anterior, tambem pode ser utilizado para mensurar a qualidade da malha para qualquer tipo de volume.

Para as duas metodologias acima, θmax e θmin representam o maior e menor ângulo nas faces do volume. Por sua vez, θe é o ângulo para a face equiangular, ou seja, 60o para o triângulo e 90o para um quadrilátero.

Pelas expressões apresentadas acima, o valor de skewness está entre 0 e 1, sendo 0 é o melhor valor possível enquanto 1 representa a pior situação. Para esta métrica, existem algumas recomendações práticas para uma boa malha. Para qualquer tipo de malha, a solução numérica pode ficar muito comprometida com valores de skewness superiores a 0,85 (quadriláteros, triângulos e hexaédros) ou 0,90 (tetraedros). Contudo, ressalto que isso depende do solver numérico utilizado e, para tal, vale olhar as recomendações do manual.

Smothness

Esta métrica está relacionada com a transição no tamanho dos volumes adjacentes na malha. Esta transição deve ser suave para evitar erros de truncamento nas aproximações numéricas para cálculo dos fluxos sobre as superfícies do volume.

Transição no tamanho de volumes adjacentes na malha, tendo variação suave e brusca


No momento de criação da malha, preocupe-se em diminuir a variacão do tamanho dos volumes adjacentes. Como regra prática, evite variações com razão entre volumes maiores que 20%. Note que isso pode afetar diretamente outras métricas, como a razao de aspecto.

Ortogonalidade

A ortogonalidade se refere ao desvio do ângulo entre o vetor que conecta o centro dos volumes adjacentes e o vetor normal à superfície entre eles.

Ortogonalidade entre os vetores normal à face e que conecta os centros dos volumes


A ocorrência de não-ortogonalidade afeta a acurácia da aproximação numérica dos fluxos, em especial a discretização do operador gradiente. Malhas com alta não ortogonalidade podem sofrer com a difusão numérica de erros na solução do problema.

Existem técnicas iterativas de correção do fluxo devido à não ortogonalidade. Contudo, é muito melhor não precisar fazer uso destas técnicas tendo o cuidado de construir uma malha de boa qualidade.

Considerações finais

De fato, existem muitas outras métricas para avaliar determinados aspectos da malha. Pode ser que alguma destas métricas seja mais importante para o solver numérico que você esteja usando. Desta forma, avalie com cuidado as métricas e vá ajustando a sua malha aos poucos. Como regra geral, existe um botão muito importante nos softwares de geração de malha chamado “Salvar” ou “Save”. Usem sem parcimônia e, inclusive, podem até salvar malhas intermediárias para recuperar alguma etapa da construção de malha.

E aí? Como você usa as métricas para avaliar a qualidade da malha? Deixe seu comentário!

Comments

  1. Olá! Primeiramente, parabens pelo post, me ajudou muito. Mas onde posso conseguir referencias sobre essas métricas, a fim de me aprofundar mais no assunto?? obrigado!

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    1. Olá, hum..., Amigo!

      As métricas dependem muito de como são calculadas pelo software de geração de malha. Então, a recomendação é ir ao manual do próprio software CFD. De qualquer forma, como referência para preparar este post eu estudei slides do software de geração de malhas Pointwise, o manual on-line do Fluent e slides sobre malhas no OpenFOAM. Todos estas referências estão disponíveis na internet. Basta perguntar ao amigo Google.

      Abs,
      Luiz F.

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  2. Olá, post muito esclarecedor.
    Tenho uma dúvida sobre a identificação de elementos negativos na malha, como posso identificá-los ainda na fase de construção da malha?
    Desde já agradeço.

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